“Quem tem medo do
Novo Acordo Ortográfico”?
O título acima sempre é usado por mim
quando falo do Novo Acordo Ortográfico. As aulas sempre correm bem, os meninos
e meninas ficam extremamente atentos e muito participativos. As perplexidades
foram surgindo e os porquês começaram a fazer-se ouvir. A cada regra que enuncio,
para a eliminação de acentos ou para a utilização do hífen, surgia, de
imediato, a exceção evidente e desconcertante. No final, e propositadamente,
mostro-lhes um texto escrito numa grafia pós-acordo que, em vez de ser una e
inequívoca, era escandalosamente mista e incompatível: uma "salada"
de português europeu e português do Brasil. A ideia era que percebessem que,
apesar de tudo, o Acordo não nos obriga a nós a escrever "brasileiro"
nem aos brasileiros a escrever conforme a grafia de Portugal. Uma vez certa,
uma aluna pergunta: “então se eu escrever “perspectiva” estarei a cometer um
erro ou não?”
Explico que em Portugal perspectiva não
é aconselhado, ao passo que no Brasil é a grafia certa, pois lá se pronuncia o
[k] antes do t. «E se eu estiver no meio do Atlântico?, brincou ela.
E eu tive vontade de nunca mais me dispor a prestar esclarecimentos sobre um
absurdo.
Ainda na ordem do dia, o
"novo" Acordo Ortográfico atrapalha a vida de muita gente, embora se
possa pensar que deixarmos de escrever algumas consoantes que não se pronunciam
pode simplificar a tarefa de escrever em português.
Atrapalha, porque as dúvidas surgem a todo o momento, sobretudo quando é
necessário escrever palavras compostas ou formadas por prefixação (cocolaborador ou
co-colaborador?), ou quando nos preparamos para usar maiúsculas (norte ou Norte?),
mas também quando não temos a certeza de se pronunciar, na "norma
culta", determinada consoante (Egipto ou Egito?).
E atrapalha muitas vezes os professores e os pais que lidam com crianças no
ensino básico e cujos manuais e textos de apoio estão escritos de acordo com as
duas grafias: a de 1945 e a de 1990. Com efeito, não é fácil para eles, nem
para as crianças, gerir com os melhores resultados, ao nível da produção, as
leituras "mistas" que se vão fazendo e que vão baralhando as
referências ortográficas de cada um.
A fase de transição é realmente muito ingrata. Pela minha parte, por mais que
deteste as novas regras que me obrigam a "descaracterizar" as
palavras (ação, ator,
redação e ótimo
parecem-me tão feias...), sei que me vou habituar e que daqui a uns tempos já
nem vou pensar mais nisso. Por outro lado, ao lidar quase diariamente com
alunos estou consciente de que as dificuldades que muitos adultos revelam na
escrita são bem mais abrangentes e graves do que as hesitações provocadas pelas
novas regras ortográficas. Custa-lhes tanto expor ideias (quando as têm) por
escrito, é-lhes tão difícil distinguir passa-se
de passasse,
ficam tão atrapalhados quando lhes peço que utilizem um registro cuidado, que o
Acordo Ortográfico. Torna-se um pormenor insignificante dentro desse grande
problema que é a sua dificuldade de expressão oral e escrita.
Devo ressalvar o fato de não serem todos - há sempre os alunos que nos
surpreendem pela positiva, que nos ensinam que nos calam a boca. Dias atrás um
aluno me corrigiu uma palavra que usei na forma antiga. Mas os que revelam
dificuldades (e que o admitem, até, com tristeza e resignação) são cada vez
mais, o que de resto não deve ser novidade para ninguém. Isto só prova que o
meu trabalho é importante, ainda bem. Mas às vezes penso: antes não fosse...
Com ou sem o Acordo
Ortográfico de 1990, as regras de ortografia andam pelas ruas da amargura...
Proponho, então, que se faça uma caça sem tréguas aos erros espalhados pelo
texto que se segue!
Há
cerca de um mês, o Sr. Aboim falava com um vizinho recém-chegado em tom peremptório
àcerca dos imigrantes. Depois sensurou-se por ter falado de modo tão
pejorativo, pois lembrou-se de que a nacionalidade do homem ainda estava por
defenir. Tinha-se basiado apenas na sua aparência e concluido que era um dos
seus, mas enganara-se. Então não notara que ele até tinha um sotaque
ligeiramente exótico?
Ontem
apercebeu-se de algo estranho ao olhar através da janela da sala. Saíu,
caminhou até á cerca de madeira que delemitava o relvado, e constactou que a
estufa, um enorme paralelipípedo beje que sobressaía no verde da paisagem,
parecia estar aberta do lado de traz. «Isto trás água no bico», pensou. E,
exitante, dirigiu-se para lá.
Quem encontrou os erros me conte?